Black Future revê disco clássico e improvável do rock nacional dos anos 80 em show com músicas novas. Fotos: Maurício Porão.
texto: Marcos Bragatto
post original: http://www.rockemgeral.com.br/2016/07/16/eles-sao-o-rio/
O vocalista do Black Future, Márcio Satanésio e a sua característica cantoria declamatória e expressiva“Não vai se jogar do palco, não?”, cobra um incauto do meio da plateia, relembrando a marcante performance de Márcio Satanésio à frente do Black Future. Dezesseis longos anos depois da última apresentação, no Cine (pornô) Íris, a banda está de volta como se o futuro negro já estivesse aqui, mas, ao mesmo tempo, ainda por vir. Não tem o mosh cobrado pelo fã, certamente das antigas, e a argumentação é a de que o palco é muito baixo – na verdade quase não há palco – na Vizinha 123, no Rio, diferentemente do Circo Voador ou do Teatro Ipanema, por onde o grupo passou deixando marcas. Mas a dodecafonia pós punk poética do quarteto segue incólume, como um moto perpétuo de destino ignorado e fora de qualquer época.
O show é planejado para fazer parte do documentário “Futuro Negro”, que segue sendo rodado no esquema colaborativo (participe aqui) e a formação é subtraída de Tantão, figura mais emblemática do que musicalmente determinante, que optou por não participar. O que, de certo modo, deixa o som mais reto e direto, com a bateria acústica do eclético Leo “Massacre Completo” Monteiro, de passagens por Acabou La Tequila e Orquestra Imperial, cuja batida seca contribui para o clima pós punk do grupo. Assim como as linhas de baixo soturnas de Olmar Jr. e a guitarra minimalista de Edson Milesi – ele mesmo, o DJ Edinho – seguem costurando a sonoridade singular do Black Future, terreno fértil para a cantoria declamatória de Satanésio.
Como se vê em “Bem Depois”, que sugere a visão de um Ian Curtis recortado de Manchester e colado perdido na Lapa em um photoshop/túnel do tempo da vida real. A música, dos “sonhos iguais”, é repetida no final, fazendo valer a gênese do bis. É também a vibe de “Eu Sou o Rio”, acrescida de uma percussão menos samba e mais tribal. Mais conhecida (teve clipe!), é a que o público mais aplaude. Fácil identificar, depois de tanto tempo, de onde vem verbalizações mais integradas ao mainstream como as de Marcelo D2 e Planet Hemp, Fausto Fawcett e Fernanda Abreu, só para citar algumas. Ao todo, são seis músicas do único disco do grupo, justamente chamado “Eu Sou o Rio”, que saiu em 1988 (ouça aqui), e que poderia ter a íntegra executada no show que ninguém iria reclamar; fazem falta, ao menos, “Sinfonia Para Um Morto” e “Teatro do Horror”.
Trevas: o guitarrista Edson Milesi, o baixista Olmar Jr., Márcio Satanésio e o baterista Leo MonteiroMas não ficam de fora a ótima “No Nights”, cujo riff de guitarra e linha de baixo sugerem uma aproximação com o funk de raiz, e a letra é total Satanésio, e até “Ciborgue”, de Arnaldo Baptista, gravada para o tributo “Sanguinho Novo”, reunindo contemporâneos do BF. A música, contudo, só saiu na versão em fita cassete, num retrato de como o grupo conseguia ser o lado b do lado b. Entre as novidades, “Outras Versões” e “Valeu a Pena” se inserem com facilidade no jeitão de ser do Black Future. A primeira abre noite com Satanésio empunhado um caderno de poesia, como em outros tempos, e a segunda traz uma guitarra que faz lembrar – escolha você mesmo – a) John McGeoch ou b) Robert Smith.
São só intensos quarenta e cinco minutinhos de bola rolando, e o show é espécie de preliminar da Festa Paradiso, que há anos reforça o rock na Cidade Maravilhosa. Para tanto, a Vizinha 123 foi decorada com espécie de engenhocas piscantes sob sacos de papelão que remetem à duplinha Satanésio e Tantão encapuzados na capa de “Eu Sou o Rio”. Que a corrida para a arrecadação da meta para a conclusão do filme seja vitoriosa, mas, se demorar um pouco e isso acarretar em mais e mais shows, ninguém vai reclamar. Ainda mais com o crescimento do entrosamento quer só o palco pode oferecer a uma temática que parece sempre atual. Se puder, não perca uma dessas aparições.
Set list completo:
1- Outras Versões
2- Bem Depois
3- Reflexão
4- Interrupção
5- Valeu a Pena
6- Ciborgue
7- Pânico
8- No Nights
9- Eu Sou o Rio
10- Quero Tocar na Lapa
Bis
11- Bem Depois
Fazendo sentido em pleno século 21: Black Future tocando o repertório do marcante álbum 'Eu Sou o Rio'
Nenhum comentário:
Postar um comentário