quarta-feira, 12 de junho de 2013

My Blood Valentine - exatas distorções de tempo

Mais de duas décadas de silêncio  absoluto desde que a faixa  Soon de Loveless, o clássico segundo disco do My Blood Valentine encerrava um dos mais lendários registros da década de 90 e da cena shoegaze – se é que podemos delimitar as coisas dessa forma. O tempo sempre foi parceiro do guitarrista  Kevin Shields  que para  (re?)alcançar o ápice daquela que ainda hoje é sua maior obra (ouve: http://www.youtube.com/watch?v=vgKptkUJ08s), precisou de três anos, em diferentes estúdios, com várias e várias horas de gravações, milhares de libras gastas e a quase falência do selo Creation Records;  também foram inúmeros registros esporádicos, com sessões espalhadas ao longo dos anos 1990, outras no começo dos anos 2000, até um fechamento que se estendeu de 2007 até o final de 2012,  quando finalmente encontraram (a banda em si) o que procuravam (ou o que procurava pois quem dá as cartas é Shields). Depois de anos de experimentações, vozes  distorcidas e uma variedade de sons que se encaminham num cenário delicado e ao mesmo tempo áspero, temos em mãos M B V (2013, Independente), o aguardado terceiro registro em estúdio da banda que redefiniu o Rock Shoegaze.
 
Assim como o antecessor, e talvez até mais  do que o debut Isn’t Anything (1988), o disco precisa de tempo para ser assimilado. Isso não quer dizer que ao final dos 46 minutos e 37 segundos de duração o ouvinte não consiga compreender a  proposta. Ao contrário, pois diferente do enigmático  álbum antecedente, M B V fornece  alguns mecanismos para se aproximar do público, com  experimentos de música eletrônica espalhados pela obra, até a fluidez nostálgica que se conecta com os dois  discos anteriores. Mesmo que pareça datado em alguns instantes pois bandas como  Deerhunter, Beach House e outras expoentes do Shoegaze/Dream Pop já concluíram algo bem melhor em seus trabalhos - mas  Shields é o tal - e  faz com que M B V excite os restritos porém fiéis admiradores do gênero (indies?), intercalando experiências sonoras que prendem novos e velhos ouvintes até os últimos ruídos.


Vamos às descrições - faixa-a-faixa  - de MBV, após uma sequência de doze audições em dois dias (é isso mesmo, eu contei):
 
 
1 – She found

Minha preferida: clássica, com guitarras saturadas e voz abafada; um lindo som, típico do MBV, que parece ter saído diretamente do primeiro disco e  o mais próximo  de uma balada "indie esquizoide" (termo inventado nesse exato instante). Música para se pensar em tudo que pode estar lhe fazendo mal ou bem e são tantas as alusões como sempre: guitarras que lembram Loveless. Perfeita...
 
2 – Only tomorrow

É o oficial  regresso dos MBV clássico: guitarra suja oposta à voz de Bilinda Butcher (uma gata não?), que continua com seu vocalize sensualíssimo e etéreo. E justamente elas, as vozes do MBV, parecem estar ligeiramente menos complexas e há também menos camadas de som que em Loveless.  Embora a estimativa do número de pedais de delay usados ainda é altíssima: aproximadamente 600. A faixa contém o uso mais estranho de uma harmónica desde que Bob Dylan enganou a todos nós fazendo de conta que sabia tocar.  No final, surge uma ótima linha melódica de guitarra, bem definida; algo que não acontecia em Loveless. Pesquisei/li em algum lugar para poder escrever aqui no Faith que o título poderia ser uma piada aos constantes atrasos na saída do disco. Vai saber...
 
 
3 – Who sees you

Bateria e guitarras envoltas em eletricidade. Retornamos a 1991. Brian Eno dizia que os MBV eram vagos e tinha razão em vários aspectos (assim como todo o universo Shoegaze é vago e enigmático demais).  Mas que se ouça (Eno e nós, que amamos toda essa superficialidade) Who sees you: o tema parece ter sido criado em cima de uma infinita busca de Shields -  “Até que ponto posso conseguir uma desafinação bela?”  O maior problema de mbv até agora é não se ouvir o baixo. Ao final, o recorde de maior quantidade de delays usados em guitarras na história do rock é batido.. Parece um tutorial de como fazer uma canção à MBV.
 
4 – Is this and yes

Presume-se que Kevin Shields finge que não ficou preso a 1991. Um órgão que não é bem Hammond, enquanto Bilinda Butcher sussurra qualquer coisa ininteligível. É preciso sobriedade para apreciar isto. Embora não estamos falando de artistas/banda sóbria. Mas o MBV não é e nunca foi para sóbrios. Fotógrafos obcecados por pouquíssima luz e (pouca) técnica então...costumamos, nós os fãs, amar o MBV porque   a banda sublinha, ilustra e faz trilha para todo nosso egocentrismo melancólico. MBV não funciona para gente racional demais e/ou um tanto quanto limitada quanto aos horizontes (isso também saiu agora tipo um transe).

 
5 – If i am

Amo falar dessa banda. Os MBV valem por detalhes: a faixa abre com um tremendo arranjo de guitarra abafado por efeitos e o arranjo soa como um tema jazzy. É a segunda -balada do disco e começa a se pensar na hipótese de mbv vir a ser usado mais vezes para trilhas de puteiros. Será o final de If I Am uma homenagem a Baba O'Riley do The Who?”. Também li essa baboseira em algum lugar  mas acaba fazendo sentido pois um disco que demora 21, pode perfeitamente homenagear um baterista que passou pelo menos 21 anos bêbado em casas de strip.
 
6 – New you

A última peça que faltava para definitivamente mbv ser uma sequência de Loveless. De volta, estão também aqueles sintetizadores que parecem flautas. 





7 – In another way

Muita sujeira logo de cara na abertura e  percussão esforçando-se  por ser moderna. Soa estranho mas é o que essa banda é: muito estranha! Este disco provoca várias reações em quem tem 35 anos ou mais. estranhíssimas; a melodia de voz imita a figura de guitarra, que, por sua vez, oscila dentro e fora da nota “pura” Uma figura melódica completamente alucinada surge lá pelo meio. Isto TEM de ser ouvido aos berros. No fim, uma quantidade doce de guitarras. É só indie-rock e não é preciso tanta agressividade.




 

8– Nothing is


Descrever mbv é incorrer no risco de repetir a frase “Esta abertura lembra Loveless”: batida de bateria por cima de guitarra em cujo som parece ter sido obtido através de 40 pedais de delay, o volume do amplificador. A  a bateria cresce e parece ser a que tem a preferência dos internautas (isso não vale pra mim); acho A Nothing is  muito brega.

 


9 – Wonder 2

A voz de Blinda Butcher (estou apaixonado) é manipulada e abafada, e depois surge uma linha de guitarra que presume   uma balada pop. Chatinha demais .




 
Se mbv fosse lançado  imediatamente após  Loveless estaríamos falando de uma obra-prima. Mas os tempos são outros. A sorte é que o MBV (a banda e não o disco) é atemporal e é impressionante o que Kevin Shields consegue (des)fazer com uma guitarra. Toda percepção de agora terá outra conotação daqui a vinte e poucos anos...


por Porão
(calcado em várias referências sem recalque algum em  assumir pois falo de uma das bandas de minha vida e tem de se " pisar em ovos" nestes casos mesmo!)

a íntegra, vai lá:

http://www.youtube.com/playlist?list=PLV5Dj2xlNnONJWlHRLnxoEDHp89rKoNpO

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