O filme do diretor russo Andrei Zvyagintsev “Leviatã”, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, recebeu grandes elogios ao redor do mundo, mas o longa divide opiniões na Rússia, onde alguns o veem como uma crítica ao presidente Vladimir Putin e ao próprio país.
Sem restrições, o filme lança um olhar direto sobre como um prefeito corrupto esmaga todos aqueles que se colocam no caminho rumo aos seus objetivos, e levou até mesmo um ativista da igreja ortodoxa russa a pedir pela proibição de sua exibição na Rússia.
Os críticos de Putin dizem que a história reflete a vida na Rússia nos últimos 15 anos, desde que o ex-espião da KGB chegou ao poder, com seus representantes públicos corruptos se enriquecendo ilícita e impunemente. O Ministério da Cultura russo foi um dos financiadores do filme, mas agora alega que o longa prejudica a imagem da Rússia somente para conseguir aclamação internacional.
“Filmes focados não somente em críticas das atuais autoridades, mas em cuspir abertamente sobre elas..., repletos de um senso de desespero e desesperança sobre nossa existência, não deveriam ser financiados pelos contribuintes”, disse o ministro da Cultura russo, Vladimir Medinsky, em uma entrevista a um jornal publicada esta semana, ao ser perguntado se o ministério apoiaria filmes similares no futuro.
Embora “Leviatã” tenha estreado em meados de 2014, os cinemas na Rússia vão começar a exibi-lo somente em fevereiro, com a ocultação do linguajar obsceno, em atendimento a leis russas sobre profanação.
O longa, em grande parte filmado na vila de Teriberka, às margens do mar de Barents, no extremo norte russo, já amealhou mais de uma dezena de premiações, incluindo um Globo de Ouro. Na quinta-feira, o filme recebeu uma indicação ao Oscar na categoria de melhor filme estrangeiro, junto com quatro outras produções.
Os autores afirmam que o filme foi parcialmente inspirado por uma história nos Estados Unidos. Muitos compatriotas do diretor, no entanto, veem a produção como direcionada diretamente a atingir a Rússia de Putin, embora o próprio Zvyaginstsev tenha procurado afastar tais ligações.
“Não importa em qual cenário os eventos desse drama se desenrolam. A história do embate entre indivíduo e autoridade é universal”, diz um texto no site de Zvyagintsev. O diretor não pôde estar imediatamente disponível para comentar.
Medinsky começou a criticar o filme no ano passado, quando “Leviatã” recebeu críticas favoráveis no Festival de Cannes, um dos mais prestigiosos do cinema. Ele disse que não gostava da excessiva profanação do filme.
Em uma entrevista publicada na quinta-feira, ele reclamou ao jornal Izvestia, veículo simpático ao Kremlin, que “Leviatã” não possuía personagens positivos. Ele afirmou que a história não se referia especificamente à Rússia, podendo se passar em qualquer lugar.
“Espero que no futuro Andrei Zvyagintsev, um homem muito talentoso, faça um filme com a assistência do Ministério da Cultura que não ressalta apenas a desesperança existencial”, disse o ministro.
No ano passado, Leviatã, foi o último filme a ser chamado para integrar a competição de Cannes. O maior festival do mundo já estava começando quando foi feito o anúncio. No final, levou o prêmio de roteiro, para Zvyagintsev. Se o diretor ficou decepcionado, disfarçou bem. A temporada de prêmios começou depois. Prêmio da crítica na Mostra de São Paulo, Globo de Ouro de filme estrangeiro e um dos cinco indicados para o Oscar da categoria. O melhor de todos? Há controvérsia. Timbuktu, de Abderrahmane Sissako, também concorria em Cannes. É o melhor dos cinco indicados para melhor filme, melhor que o polonês Ida, que o argentino Relatos Selvagens, mas foi esquecido pelo júri presidido pela cineasta Jane Campion, talvez até por motivos que não têm nada a ver com arte. O filme é crítico ao avanço do Islã e do júri participava a atriz iraniana Leila Hatami, de A Separação. Ela provavelmente teria ficado em apuros com a vitória de Timbuktu.
Mas Leviatã, além de favorito no Oscar, é muito bom. E Zvyagintsev é diplomático. Um autor que mede as palavras e não confirma, em suas declarações, a pesada crítica que o filme faz à Rússia pós-comunista. Seu filme foi feito para contestar o poder? "Você acha? Por quê?" Ele narra uma história de corrupção e violência que se passa em boa parte em gabinetes de burocratas que são sempre enquadrados com o retrato do czar Vladimir Putin ao fundo. "Ah, isso? Mas se a história é contemporânea e ele é o governante, o retrato de quem você queria que eu colocasse? Ainda não mostrei o filme para ele, mas duvido que Putin pense que o estou confrontando. Além do que, seria absurdo."
No limite, é possível que Leviatã seja o maior ataque ao regime já feito na Rússia. A questão é - qual regime? Numa cena, os personagens praticam tiro ao alvo em retratos de representantes do antigo regime. O filme conta a história de um homem comum que possui a casa certa no lugar errado. Ele gosta dessa casa, mas ocorre que os burocratas encastelados no poder têm um plano urbanístico para essa região. Ele resolve confrontá-los. Sua vida, o casamento, tudo vai para o ralo. "A burocracia é um inferno em qualquer país. Até pelos meus encontros com jornalistas aqui em Cannes, posso dizer que todos me relataram casos semelhantes em seus países. Para mim, a parábola é universal." Tão universal que Zvyagintsev revela - "Baseio-me num caso ocorrido nos EUA."
Mesmo tendo cuidado com as palavras, ele é crítico - "Já tenho 50 anos e nunca votei na vida. Viver na Rússia é como estar num campo minado. É difícil, senão impossível estabelecer um plano de vida, de carreira. Há uma disputa absurda pelo poder, e nesse processo o artista raramente é bem-visto. Os poderosos quem ser adulados e desprezam os que o fazem. Os críticos são inimigos e tratados como tal." O repórter cita o caso de outro cineasta muito crítico em relação à Rússia contemporânea, Sergei Loznitsa. "Se você já conversou com Sergei, sabe como é a vida na Rússia." O filme conta a história de Nikolai, ou Kolya, interpretado por Aleksei Serebryakov. Sua família viveu sempre nessa casa com vista para o mar que, agora, o prefeito quer demolir para construir um empreendimento imobiliário.
Aleksei torna-se um empecilho. Luta contra um sistema monstruoso, que vai usar contra ele suas forças, para reduzi-lo a frangalhos. É a pergunta que não quer calar - quem é ou o que é o Leviatã do título? É uma criatura mitológica de grandes proporções, que frequenta o imaginário do Ocidente desde que os navegantes europeus da Idade Média se lançaram ao mar. Antes disso, no Velho Testamento, já existem referências a Leviatã no Livro de Jó. E no filme? Existem restos de um monstro marítimo na praia, mas o Leviatã no título do filme de Zvyagintsev será o sistema que Nikolai enfrenta? E será o próprio Nikolai a moderna encarnação de Jó?
"Você não espera honestamente que eu lhe responda. Essa é a sua parte, e a parte do espectador. Estou compondo uma parábola que cabe ao outro decifrar. Se eu fornecer as respostas, as perguntas perdem o sentido, do ponto de vista dramatúrgico." Estudante no interior da Sibéria, Zvyagintsev sonhava ser ator. Em Moscou, desde 1986, tornou-se diretor. Fez O Retorno, que ganhou o Leão de Ouro em Veneza, Banishment e Elena. Zvyagintsev já foi comparado a Andrei Tarkovski, talvez pela forma como esculpe o tempo. Ele acha que a referência está mais nos olhos de quem vê. Zvyagintsev filmou Leviatã no Mar de Barents, no norte da Rússia. "É espetacular, não? Precisava dessa paisagem para realçar o drama humano."
parte das informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Sem restrições, o filme lança um olhar direto sobre como um prefeito corrupto esmaga todos aqueles que se colocam no caminho rumo aos seus objetivos, e levou até mesmo um ativista da igreja ortodoxa russa a pedir pela proibição de sua exibição na Rússia.
Os críticos de Putin dizem que a história reflete a vida na Rússia nos últimos 15 anos, desde que o ex-espião da KGB chegou ao poder, com seus representantes públicos corruptos se enriquecendo ilícita e impunemente. O Ministério da Cultura russo foi um dos financiadores do filme, mas agora alega que o longa prejudica a imagem da Rússia somente para conseguir aclamação internacional.
“Filmes focados não somente em críticas das atuais autoridades, mas em cuspir abertamente sobre elas..., repletos de um senso de desespero e desesperança sobre nossa existência, não deveriam ser financiados pelos contribuintes”, disse o ministro da Cultura russo, Vladimir Medinsky, em uma entrevista a um jornal publicada esta semana, ao ser perguntado se o ministério apoiaria filmes similares no futuro.
Embora “Leviatã” tenha estreado em meados de 2014, os cinemas na Rússia vão começar a exibi-lo somente em fevereiro, com a ocultação do linguajar obsceno, em atendimento a leis russas sobre profanação.
O longa, em grande parte filmado na vila de Teriberka, às margens do mar de Barents, no extremo norte russo, já amealhou mais de uma dezena de premiações, incluindo um Globo de Ouro. Na quinta-feira, o filme recebeu uma indicação ao Oscar na categoria de melhor filme estrangeiro, junto com quatro outras produções.
Os autores afirmam que o filme foi parcialmente inspirado por uma história nos Estados Unidos. Muitos compatriotas do diretor, no entanto, veem a produção como direcionada diretamente a atingir a Rússia de Putin, embora o próprio Zvyaginstsev tenha procurado afastar tais ligações.
“Não importa em qual cenário os eventos desse drama se desenrolam. A história do embate entre indivíduo e autoridade é universal”, diz um texto no site de Zvyagintsev. O diretor não pôde estar imediatamente disponível para comentar.
Medinsky começou a criticar o filme no ano passado, quando “Leviatã” recebeu críticas favoráveis no Festival de Cannes, um dos mais prestigiosos do cinema. Ele disse que não gostava da excessiva profanação do filme.
Em uma entrevista publicada na quinta-feira, ele reclamou ao jornal Izvestia, veículo simpático ao Kremlin, que “Leviatã” não possuía personagens positivos. Ele afirmou que a história não se referia especificamente à Rússia, podendo se passar em qualquer lugar.
“Espero que no futuro Andrei Zvyagintsev, um homem muito talentoso, faça um filme com a assistência do Ministério da Cultura que não ressalta apenas a desesperança existencial”, disse o ministro.
No ano passado, Leviatã, foi o último filme a ser chamado para integrar a competição de Cannes. O maior festival do mundo já estava começando quando foi feito o anúncio. No final, levou o prêmio de roteiro, para Zvyagintsev. Se o diretor ficou decepcionado, disfarçou bem. A temporada de prêmios começou depois. Prêmio da crítica na Mostra de São Paulo, Globo de Ouro de filme estrangeiro e um dos cinco indicados para o Oscar da categoria. O melhor de todos? Há controvérsia. Timbuktu, de Abderrahmane Sissako, também concorria em Cannes. É o melhor dos cinco indicados para melhor filme, melhor que o polonês Ida, que o argentino Relatos Selvagens, mas foi esquecido pelo júri presidido pela cineasta Jane Campion, talvez até por motivos que não têm nada a ver com arte. O filme é crítico ao avanço do Islã e do júri participava a atriz iraniana Leila Hatami, de A Separação. Ela provavelmente teria ficado em apuros com a vitória de Timbuktu.
Mas Leviatã, além de favorito no Oscar, é muito bom. E Zvyagintsev é diplomático. Um autor que mede as palavras e não confirma, em suas declarações, a pesada crítica que o filme faz à Rússia pós-comunista. Seu filme foi feito para contestar o poder? "Você acha? Por quê?" Ele narra uma história de corrupção e violência que se passa em boa parte em gabinetes de burocratas que são sempre enquadrados com o retrato do czar Vladimir Putin ao fundo. "Ah, isso? Mas se a história é contemporânea e ele é o governante, o retrato de quem você queria que eu colocasse? Ainda não mostrei o filme para ele, mas duvido que Putin pense que o estou confrontando. Além do que, seria absurdo."
No limite, é possível que Leviatã seja o maior ataque ao regime já feito na Rússia. A questão é - qual regime? Numa cena, os personagens praticam tiro ao alvo em retratos de representantes do antigo regime. O filme conta a história de um homem comum que possui a casa certa no lugar errado. Ele gosta dessa casa, mas ocorre que os burocratas encastelados no poder têm um plano urbanístico para essa região. Ele resolve confrontá-los. Sua vida, o casamento, tudo vai para o ralo. "A burocracia é um inferno em qualquer país. Até pelos meus encontros com jornalistas aqui em Cannes, posso dizer que todos me relataram casos semelhantes em seus países. Para mim, a parábola é universal." Tão universal que Zvyagintsev revela - "Baseio-me num caso ocorrido nos EUA."
Mesmo tendo cuidado com as palavras, ele é crítico - "Já tenho 50 anos e nunca votei na vida. Viver na Rússia é como estar num campo minado. É difícil, senão impossível estabelecer um plano de vida, de carreira. Há uma disputa absurda pelo poder, e nesse processo o artista raramente é bem-visto. Os poderosos quem ser adulados e desprezam os que o fazem. Os críticos são inimigos e tratados como tal." O repórter cita o caso de outro cineasta muito crítico em relação à Rússia contemporânea, Sergei Loznitsa. "Se você já conversou com Sergei, sabe como é a vida na Rússia." O filme conta a história de Nikolai, ou Kolya, interpretado por Aleksei Serebryakov. Sua família viveu sempre nessa casa com vista para o mar que, agora, o prefeito quer demolir para construir um empreendimento imobiliário.
Aleksei torna-se um empecilho. Luta contra um sistema monstruoso, que vai usar contra ele suas forças, para reduzi-lo a frangalhos. É a pergunta que não quer calar - quem é ou o que é o Leviatã do título? É uma criatura mitológica de grandes proporções, que frequenta o imaginário do Ocidente desde que os navegantes europeus da Idade Média se lançaram ao mar. Antes disso, no Velho Testamento, já existem referências a Leviatã no Livro de Jó. E no filme? Existem restos de um monstro marítimo na praia, mas o Leviatã no título do filme de Zvyagintsev será o sistema que Nikolai enfrenta? E será o próprio Nikolai a moderna encarnação de Jó?
"Você não espera honestamente que eu lhe responda. Essa é a sua parte, e a parte do espectador. Estou compondo uma parábola que cabe ao outro decifrar. Se eu fornecer as respostas, as perguntas perdem o sentido, do ponto de vista dramatúrgico." Estudante no interior da Sibéria, Zvyagintsev sonhava ser ator. Em Moscou, desde 1986, tornou-se diretor. Fez O Retorno, que ganhou o Leão de Ouro em Veneza, Banishment e Elena. Zvyagintsev já foi comparado a Andrei Tarkovski, talvez pela forma como esculpe o tempo. Ele acha que a referência está mais nos olhos de quem vê. Zvyagintsev filmou Leviatã no Mar de Barents, no norte da Rússia. "É espetacular, não? Precisava dessa paisagem para realçar o drama humano."
parte das informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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