segunda-feira, 14 de abril de 2014

cine noia: Perfume

O filme se passa numa França fétida e pútrida do século 18, cheia de corrupção, mortes e fome. Em contraste, perfumes são utilizados pela nobreza, cercada de beleza e luxos. Para ilustrar tudo isso, a trama conta com figurino e cenários incríveis. Perfume: A História de um Assassino (Perfume: The Story of a Murderer)é baseado no livro alemão Das Parfum, die Geschichte eines Mörders (O perfume, história de um assassino), do escritor Patrick Süskind lançado em 1985. Considerado impossível de ser transformado em filme por Stanley Kubrick e Martin Scorsese mas não para o diretor alemão Tom Tykwer que foi capaz da proeza. O filme de 2012 ainda conta com fotografia e montagem muito interessantes mesclando diversos estilos e com um resultado sombrio sublime que muito me foi útil fotograficamente falando.

A história protagonizada pelo jovem francês Jean-Baptiste Grenouille que possui um olfato extraordinário que lhe permite a sensibilidade para odores como ninguém inclusive para lembrar-se de todos eles.

Como a língua falada não consegue transmitir todas as sensações e sentimentos de Jean ele é vai ficando cada vez mais isolado obcecado em possuir em sua memória todos os cheiros do mundo a qualquer preço.  

O jovem ator que interpreta Jean-Bapstiste, Ben Whishaw surgiu como uma promissora revelação ao encarnar um personagem assustadoramente ambíguo: um autêntico selvagem com alma de artista criado sem qualquer tipo de compasso moral com o qual pudesse aprender regras de convivência básicas ou que lhe permitisse reconhecer a natureza repulsiva de um ato de brutalidade – o que, para ele, é algo inato às relações interpessoais, já que sempre foi tratado com violência (escapando duas vezes de uma morte cruel ainda no dia de seu nascimento). Assim, quando mata pela primeira vez, Jean-Baptiste mais parece uma criança que, ao acariciar com força excessiva um filhote de passarinho, surpreende-se ao perceber que este não pode mais voar ou cantar. Isto, aliás, permite que o espectador simpatize com o personagem mesmo depois que o rapaz dá início às suas atividades homicidas – e Whishaw é brilhante ao transformá-lo em um indivíduo simultaneamente perigoso e inocente.

Introspectivo não por opção, mas por ser incapaz de compreender os próprios sentimentos, Jean-Baptiste é um fantasma vivo – e sua falta de cheiro (uma característica que o leva a ser ignorado por todos, até mesmo pelos animais) ganha um caráter inequivocamente religioso ao longo da projeção.

Porém, o que mais surpreende em Perfume é sua conotação claramente religiosa, a começar pela postura de adoração que Jean-Baptiste  assume ao observar o processo de destilação utilizado para capturar a essência de plantas (e pessoas). Nestes momentos, é como se o protagonista estivesse testemunhando algo sagrado – e, neste contexto, a “essência” funciona quase como um sinônimo de “alma”, o que explica a frase de Baldini ao ensinar a destilação para seu pupilo: “É como capturar o perfume das rosas em sua morte”. 

Ao cheirar com devoção o corpo de sua primeira vítima (num ato necrofílico de bizarra beleza), o protagonista expõe totalmente suas vulnerabilidades e carências – e seu desespero ao perceber que o aroma sensual da garota se esvaiu com a morte é estranhamente tocante, assim como sua tentativa de segurar o intangível. O filme estabelece uma relação mítica entre Jean-Baptiste e Jesus Cristo – algo que fica óbvio quando vemos o protagonista de braços abertos e estendidos em meio a uma multidão hostil. E não é à toa que todos aqueles que têm a oportunidade de conviver com o rapaz acabam dividindo o mesmo destino quanto são deixados para trás; afinal, não há razão para continuar respirando depois que um ser “iluminado” (Divino? Abençoado? Superior?) como Jean-Baptiste sai de nossas vidas.

Perfume jamais será uma unanimidade e talvez até irrite boa parte do público, que facilmente pode estranhar os incidentes aparentemente ilógicos que tomam conta da narrativa como  o sexo que nem sempre é uma manifestação puramente física; muitas vezes, é uma representação do prazer que surge da comunhão entre as pessoas. Amar resulta em tocar, abraçar, beijar e, se for o caso, em sexo. 

Infelizmente para Jean-Baptiste, sua habilidade em despertar estes impulsos nas outras pessoas não se traduz em carinho e amor direcionados a ele mesmo; ele sempre será um indivíduo sem cheiro, atrativos ou alma.

por Porão

     trailer:



e combina com esse som:


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