sexta-feira, 11 de abril de 2014

Claudio Bedran - o papo é Blues Etílicos

O Blues Etílicos se transformou em patrimônio carioca! Essa afirmação nem é coisa de fanático não! Quem me conhece sabe que sou um representante das culturas mais sombrias - goticismo, pós punk, punk, metal extremo em geral - . Mas o Blues Etílico não é nada disso, não é sombrio e sim existencialista. Uma das melhores bandas de blues do mundo (sim, isso não é bairrismo, nem ufanismo ou qualquer outra merda sem noção. São dados, é história, é blues, é música, é foda pra caralho! Com muito orgulho, inicio com o simpático baixista Cláudio Bedran uma série de abordagens a alguns dos músicos da banda para destrinchar a trajetória orgulhosa deles.

entrevista por Porão
fotos - acervo fotográfico/fototeca (essa porra existe?) do face do Cláudio -
não localizei os créditos então estou colocando o link:
https://www.facebook.com/claudio.bedran/photos_albums


Porão - É impressionante como várias bandas brasileiras contemporâneas de blues se desfizeram ou se subdividiram em carreiras solos de seus membros e o Blues Etílicos continua firme e forte (inclusive com os projetos particulares de seus membros!) Como pode isso? Nunca tiveram problemas com formação, egos e coisas desse tipo?

Cláudio Bedran - Problemas sempre tivemos e culminaram na saída do Gil Eduardo e entrada do Pedro Strasser (bateristas) lá pelo meio dos anos 90. Mas cada vez menos. Ficar velho tem que servir pra alguma coisa no fim das contas. E carreiras solo também. O que nos mantém juntos é a liberdade pra fazer o que quisermos em paralelo ao BE, somada à noção de que juntos fazemos algo que é maior que a soma das partes. Tipo uma entidade com vida própria que "invocamos" quando nos juntamos.


Porão - Vamos bem pelas bases então: como foi o início do Blues Etílicos e como se encontraram?


Cláudio Bedran - Putz! Aí me fodeu! Uma biografia enorme:  Flávio e eu éramos amigos desde o início dos 80. Uma bela noite de 85, entre uma cerveja e outra, ele deu a idéia de montarmos uma banda de blues. A essa altura eu já tocava por aí mas queria fazer parte de algo mais original e achei a idéia ótima. O Flávio conhecia um guitarrista, Sérgio Bap e eu um baterista, Paulo Batera. No caminho pintou o Otávio Rocha que tinha um sebo de discos - o que lhe permitia acesso a discos de blues - raridade por aqui na época - e tocava slide. Nós cinco fizemos um par de shows em dezembro de 85 no "Viro da Ypiranga". Numa reunião pra escolher o nome,  que queríamos que incluísse a palavra "Blues", o Paulo Batera, ao nos ver todos de copo na mão, sugeriu o "Etílicos". Mas o Sérgio, que mandou o release pro jornal, botou o "originalíssimo" nome de "Banda Experiência", o que na verdade definia melhor aquilo ali. Pouco depois, Otávio foi de bike pros US, o Paulo saiu, nos desentendemos com Sérgio e começamos a procurar outros caras. Enquanto isso, eu e Flávio compusemos umas canções. Com Rodolpho Rebuzzi na guitarra e o suíço Bernard Christian na batera, gravamos uma demo de "Safra 63", que a Maldita Fluminense FM botou no ar. E foi aí que o Blues Etílicos começou a existir de verdade. Estávamos em junho de 86, a ditadura tinha acabado, mas o presidente ainda era "indireto". A letra falava do golpe, a gaita era maneira e "Safra 63" fez um certo sucesso. Fizemos uma ou duas dúzias de shows com essa formação. Sentindo falta de outra guitar, pusemos um anúncio numas escolas de música. E aí, Otávio chegou de viagem e automaticamente retornou pra banda. Mas ninguém se deu ao trabalho de tirar o anúncio na Proarte e, por conta disso, um puta guitarrista US nos procurou. Chamava-se Derek Bosshart e tocava blues MESMO. Daí, Rodolpho "sobrou". Na seqüência o suíço voltou pra casa e Otávio assumiu a batera, seu 2º instrumento. Nas palavras do Otávio: "Essa formação durou até a noite em que Derek, num estado etílico bastante avançado, esqueceu sua Fender raríssima dentro de um táxi, entrou em profunda depressão e resolveu viajar de carona pela América do Sul, mas tendo a gentileza de antes apresentar à banda o guitarrista e cantor Greg Wilson, também norte-americano, que fez a sua estréia no Pappus Bar, um barzinho bem
divertido que ficava no bairro do Rio Comprido, no Rio." Era acid blues/rock total, algo que não existia no Brasil, pelo menos até aquele verão de 87, com as letras em inglês sendo cantadas sem sotaque, coisa também difícil de se ouvir. Isso chamou a atenção dos proprietários de uma loja de discos raros e importados, a Satisfaction Discos, que também tinham um programa de Blues na Maldita. Assumiram o empresariamento e produziram nosso primeiro LP, o independente "Blues Etilicos", já com o baterista Gil Eduardo, (filho do Erasmo Carlos), Otávio Rocha na slide, Greg Wilson na voz/guitarra, Flávio Guimarães na gaita/voz e comigo no baixo. Essa formação basicamente se mantém até hoje, fora a troca nas baquetas em 95, saindo Gil pra entrada do Pedro Strasser. Graças ao 1º disco, com composições nossas (minhas e do Flávio) em português, alguns clássicos em inglês e uma instrumental, a banda atingiu ainda mais rádios e palcos. Com o aumento de exposição, fomos contratados pela Gravadora Eldorado, do grupo Estado de São Paulo, e lançamos nosso 2º trabalho, "Água Mineral". Em 89 rolou o 1° Festival Internacional de Blues, em Ribeirão Preto, com a nata do blues mundial: Albert Collins, Buddy Guy, Junior Wells, Etta James, Magic Slim, conosco abrindo o evento, e logo para o Buddy Guy. Foi nosso batismo de fogo, o fim do nosso início, digamos assim.


Porão - Que foda esse início hein! Puta que pariu! Quantos discos já são ao todo e quais os mais importantes pra você e por quais motivos? 

blues etílicos e léo gandelman

Cláudio Bedran - São 12 discos e um DVD. -O primeiro, "Blues Etílicos", de 87, um tipo de reencarnação na mesma vida, pois mudou meu destino, abriu a possibilidade de viver fazendo o que eu mais gosto. Naquela altura era muito caro e difícil lançar um trabalho independente e foi uma sensação "foderástica". Além do mais, como sou compositor (solo ou com o Flávio) de todas as músicas em português, foi um orgulho danado. -O "Salamandra", de 94, talvez seja o de melhor sonoridade entre todos. O Engenheiro de Som foi o Tom Swift, que gravou AC/DC e Miles Davis, ou seja, totalmente muito ótimo pra cacete mesmo. Um profissional raríssimo. E tem uma das coisas mais bonitas que já gravamos, "People Get Ready", do Curtis Mayfield, com o Ed Motta destruindo nos vocais. Tem também "Gamblers", uma homenagem ao meu Vô, que morreu numa mesa de jogo num cassino clandestino, além da música título, um instrumental viajandaço. -O DVD, de 2012, que, além de ser um ótimo resumo da fase com o Pedro Strasser na bateria, tem um puta som e um ótimo desempenho musical da galera. A verdade é que, a partir do "Viva Muddy Waters", de 2007, o nível da nossa performance como instrumentistas atingiu um patamar bem mais sério. -"Puro Malte", de 2013. É do KCT fazer um disco só com inéditas depois de 27 anos de banda. Muitas das melhores composições em português que gravamos na vida estão ali, parcerias fodas, além da instrumental "Cracatoa", com o Leo Gandelman arrebentando no sax.


Porão - Na minha opinião humilde - e olha que sou um cara mais do metal/punk - o Blues Etílicos se transformou em patrimônio carioca! Falo isso porque já os assisti no interior de Santa catarina (Festival Psicodália) e deu orgulho sentir o respeito que a banda tem no resto do país. Fala sobre isso por favor! 

Cláudio Bedran - Cara, obrigado! É uma honra ouvir um troço desses. É difícil falar sobre isso, porque é uma percepção de fora e quem é da banda não tem como ver com tanta clareza pois está envolvido demais. Sei que quando olho para os caras que tocam comigo vejo alguns dos melhores instrumentistas de rock/blues do Brasil. E quando tocamos juntos, rola uma química, uma telepatia, que só décadas de estrada e convívio musical podem produzir. Como já disse, me sinto parte de uma entidade maior do que a soma de nossas individualidades. Além de adorar o Brasil, em especial a sensação de viver num continente com mil facetas, somos cariocas, por coincidência todos vivemos dentro de cartões postais da cidade (Santa Tereza, Joá, Ipanema, Praia do Flamengo, Beira Mar) e isso sai no nosso som. As letras de nosso mais recente CD, "Puro Malte", refletem esse lance cariocão: "Moro onde Morava o Mar", "Me Leva Pro Rio" e por aí vai.

continua...

3 comentários:

  1. Esses etílicos são completamente bons demais, fazem uma sonzeira de altíssimo nível, e quem assiste os caras no palco, quer sempre mais...puta sincronia...Bedran (buldogueiro, quase um mestre cervejeiro, puta pensador, baixo invertido, pervertido), Otávio Rocha (ILUMINADO e um gato), Flávio faz uma gaita parecer guitarra que me confunde e detalhe que às vezes ele dá uma palhinha cantando um blues que é extraordinário (tem que ir no show para ver e ter sorte no dia) Pedrão, quando desce a baqueta é doidice, geral fica amarradão e o Greg é um charme de presença e voz.

    Maurício Porão, continua mesmo, porque está ótimo.

    Ana Claudia - RJ

    ResponderExcluir
  2. Blues Etilicos é PHODA !
    Pra quem nunca ouviu , o ideal é começar pelo "aguas barrentas - ao vivo" .

    ResponderExcluir