Tinha um gato que andava nu, nunca se importou com este fato, sabia que só gatos cegos ou mal amados eram vestidos com algum sininho dourado no pescoço ou gravatinhas com lantejoulas.
Este gato tinha por costume observar a sua sombra e também não se importar demasiado, sabia que só alguns felinos de outra raça só caçavam sombras por falta de alguma proteína negada na sua infância.
Ele, o gato, este gato, costumava passar horas a contemplar o silêncio nas suas diferentes formas, ora era alguma brisa que avizinhava tormentas, ora o voo rasante das gaivotas no horizonte.
Sentia que só o silêncio traria para si a poesia certeira dos seus saltos, as cores absolutas da sua paciência e a meticulosidade iluminada das suas garras.
Certo dia, antes de ir percorrer a noite, o gato, viu numa parede um quadro com a figura de um peixe entalhado em madeira, observou por alguns instantes e virando a cara pensou: " bom, ele está preso a sua beleza e comodidade de uma moldura rígida, eu sem molduras e nu tenho o universo como destino".
Saiu em silêncio, a noite estava tão nua como ele e o esperava de braços abertos.
Texto e fotografia: Flavio Pettinichi- 2015
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